Antes de nos perguntarmos o que é a
Geografia ou o que a Geografia estuda - no fim das contas ambas as questões se
resolvem numa só problemática - precisamos nos perguntar por que estudarmos
Geografia? Para que serve a Geografia? Ou para quem serve? Precisamos também
nos colocar para além das respostas prontas, das finalidades estabelecidas em
livros didáticos, livros de ensino de geografia ou documentos oficiais.
A Geografia que se pratica nas
escolas certamente tem um valor e uma importância social, para além de
conhecimento estratégico ou pragmático. Mas não podemos tomar como objetivo da
Geografia, sem mais questionamentos, “formar cidadãos críticos” ou construir “consciência crítica”. De
todas as disciplinas escolares a Geografia é a que aborda temas e problemas da
sociedade e mundo em que vivemos. É a ciência que nos ajuda a compreender essa
sociedade, interpretá-la, posicionar-se nela de uma forma escalar, abrangendo
todos os lugares do mundo. Em que a geografia ajuda/contribui para “formar” cidadãos? E de que modo a geografia escolar pode contribuir para o pensamento crítico? A
Geografia pode contribuir para o exercício da cidadania, práticas
de cidadania, mas esta não é uma especificidade disciplinar, é, de um modo
geral, uma tarefa da educação escolar.
E consciência crítica? O que é
isso? É evidente que a consciência se desenvolve a partir da aprendizagem, de
todo processo aprendizagem. E que a crítica é fundamental para nos
posicionarmos no mundo como sujeitos, agentes, protagonistas. Porém, por que a
Geografia também não atuaria no sentido de construir um novo sentimento, novas
formas de sentir, de querer, de imaginar, tanto quanto pensar e atuar no mundo?
E a crítica? O que é a crítica sem a análise, a interpretação, a compreensão, a
meditação, a reflexão? A geografia permite uma crítica do mundo, das
instituições, dos sujeitos e da sociedade em que vivemos a partir de uma
análise, de uma interpretação geográfica. Portanto, a especificidade do ensino
de geografia é possibilitar o desenvolvimento de conhecimentos geográficos da
sociedade e do mundo que contribua para a constituição de novos sujeitos, de
novos protagonistas sociais, cidadãos de direito e de fato. Nesse caso, a cidadania deve está articulada ao reconhecimento das diferentes identidades socioculturais.
A Geografia é importante porque
possibilita o desenvolvimento/construção de conhecimentos sobre a sociedade como espaço
socialmente produzido. Por isso ensinamos Geografia: porque não existe
sociedade sem espaço. Ao se organizar socialmente os homens e as mulheres ao
mesmo tempo constroem espaço. Não existe uma sociedade que se organize primeiro
e depois construa “seu” espaço, toda sociedade se organiza espacialmente desde
o início e sempre (Porto-Gonçalves, 2003).
Do ponto de vista da transformação
e da mudança a que todo conhecimento visa, pois não tem sentido um conhecimento
que vise promover mudança, a Geografia e o espaço geográfico têm grande
importância. Acostumamos a compreender a mudança em termos de tempo, de
história, pois é fato sabido que nós fazemos a história. No entanto, toda
mudança histórica é mudança geográfica. Fazemos a Geografia do mesmo modo que
fazemos a história. E não há como alterar as condições sociais presentes
conservando o espaço tal como este se apresenta. Não há como criar “um mundo em
que caiba outros mundos”, como entendem os zapatistas, sem outras geografias,
outros espaços geográficos.
A Geografia é a ciência dos
“outros”, outros espaços, outros povos, outros grupos sociais, outras culturas.
Portanto, a Geografia ensina pela interpretação do espaço a diferença, a
pluralidade da condição social e geográfica humana. E ensina também a pensar e
atuar espacialmente para transformação social.
Podemos fazer a seguinte pergunta:
todos possuem uma vida boa? Todos vivem bem, com dignidade no mundo atual?
Certamente que não, sabemos. Então, por isso estudamos Geografia: porque
precisamos transformar a vida transformando o espaço! Não teria sentido estudar
Geografia se através desse conhecimento não fosse possível encontrar
alternativas para uma vida melhor, para uma vida mais digna. E esta vida boa,
esse bem viver, de que a grande maioria da humanidade carece, só é possível com
a construção de novos espaços de vida.
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